Há décadas o Slow Food luta ativamente contra os OGMs, e está fazendo sua voz ser ouvida entre os tomadores de decisão, especialmente na Itália, Reino Unido e Bruxelas, à medida que novas técnicas de edição de genoma estão sendo impulsionadas pelos lobistas da indústria, com o suposto objetivo de produzir alimentos de forma mais sustentável.
Na Europa, o debate sobre OGMs “transgênicos” – em que genes estranhos são introduzidos em alimentos ou em animais para dar ao organismo novas propriedades ou características que não possui naturalmente – reduziu-se nas últimas duas décadas, já que a grande maioria dos países da UE decidiu proibir a produção de transgênicos em suas terras. Entretanto, é a desregulamentação das novas técnicas de edição de genoma (que a indústria define como “Novas Técnicas de Reprodução”), incluindo a CRISPR-Cas9, que está preocupando as organizações da sociedade civil, incluindo o Slow Food.
Em 2018, o Tribunal de Justiça Europeu decidiu que essas novas técnicas devem ser regulamentadas como OGMs, ou seja, devem ser submetidas a uma avaliação completa de risco, devem ser rastreáveis e os alimentos incluindo essas novas técnicas devem ser rotulados de forma clara. Desde então, o intenso lobby da indústria biotecnológica e dos sindicatos de grandes produtores foi implacável, unindo-se à voz de vários políticos favoráveis aos OGMs, que esperam que a decisão seja anulada. Isso exige uma vigilância constante de ONGs, produtores e consumidores para garantir que esses novos OGMs continuem rigidamente regulamentados, pois apresentam os mesmos riscos que a antiga geração de OGMs para a soberania alimentar, o meio ambiente, a saúde pública, a biodiversidade e a liberdade de escolha de consumidores e agricultores.
Itália – O Poder de Atuar Juntos
Essa vigilância tornou-se fundamental no momento em que todos se preparavam para as festas de Natal, quando o (agora ex) ministro italiano da Agricultura propôs 4 projetos de decretos legislativos sobre sementes e plantas. As propostas incluíam uma tentativa disfarçada de abrir o caminho para OGMs e novos OGMs. Graças à reação imediata e conjunta da sociedade civil que alertou contra qualquer reabertura da legislação sobre transgênicos, a proposta foi anulada.
As organizações, entre elas o Slow Food, organizações ambientais, organizações de consumidores, apicultores e organizações de produtores orgânicos e pequenos produtores, escreveram, em 11 de janeiro de 2021, antes do voto no Parlamento, para denunciar “a tentativa do governo de liberar os OGMs, novos e velhos, apenas para favorecer um número limitado de empresas, a maioria grandes multinacionais, que querem assumir o controle da cadeia agroalimentar e pretendem enfrentar produtores e consumidores com decisões já tomadas, com produtos de qualidade duvidosa, patenteados, não rastreáveis, violando o Princípio da Precaução, que garante saúde, meio ambiente e biodiversidade, sem qualquer análise do impacto sobre o sistema agrícola nacional”.
Inglaterra – Trabalhando com Comerciantes
No início deste mês, o governo do Reino Unido lançou uma consulta pública sobre edição de genoma, uma primeira ação pós-Brexit, que causa preocupação entre as organizações ambientalistas, alimentares e de consumidores. O foco da consulta é evitar que organismos com genoma editado sejam regulamentados da mesma forma que os cultivos geneticamente modificados. O secretário do Meio Ambiente do Reino Unido argumentou que a edição de genoma poderia ser usada para desenvolver cultivos mais resistentes a doenças e condições climáticas extremas, e que poderia “oferecer vantagens enormes para o setor e o meio ambiente”. Embora seja limitada apenas à Inglaterra, os outros países do Reino Unido teriam dificuldade de impedir que os OGMs chegassem às lojas. O comércio com a UE ficaria ainda mais complicado.
A consulta é aberta a empresas, ONGs e produtores, mas qualquer pessoa que queira se manifestar (e manifestar suas preocupações) em relação aos novos OGMs pode participar. No entanto, a complexidade do tema e a confusão sobre a regulamentação de tais produtos significa que não é fácil mobilizar os cidadãos. É por isso que uma coalizão de ONGs e grupos da sociedade civil mobilizaram-se juntos, para informar os cidadãos sobre a consulta, mas também para assisti-los a responderem à consulta.
Além disso, o Slow Food UK coordenou, junto com a iniciativa Beyond GM, o envio de cartas para as mais importantes cadeias de supermercados e fornecedores de alimentos do Reino Unido, reunindo ONGs, organizações e líderes da sociedade civil, e acadêmicos. Muitos participantes favoráveis aos OGMs gostam de afirmar que os consumidores querem alimentos com genoma editado, mas para o Slow Food é evidente – e as pesquisam provam isso – que a maioria dos cidadãos do Reino Unido quer um tipo de sistema alimentar completamente diferente. O objetivo da coalizão da sociedade civil é mostrar que há pouca ou nenhuma demanda por alimentos com genoma editado, e pedir que as lojas se recusem a vender esses produtos, retirando-os das prateleiras.
União Europeia – Reunião com Tomadores de Decisões Políticas
Na primavera de 2020, a UE revelou sua “Estratégia do Prado ao Prato”, a primeira estratégia em que a UE adota uma abordagem dos sistemas alimentares que tem o potencial de acelerar a transição para um sistema alimentar mais sustentável. Contudo, entre as muitas ferramentas que a UE propõe usar para alcançar suas ambiciosas metas ambientais e sociais, existem “novas técnicas genômicas” (mais um nome para novos OGMs) que, de acordo com a Comissão, têm o “potencial de melhorar a sustentabilidade ao longo da cadeia de fornecimento de alimentos”.
O Slow Food e uma ampla coalizão de organizações alertaram contra a inclusão dessas técnicas na Estratégia e multiplicaram seus esforços para lembrar à Comissão Europeia que, de acordo com a lei, os novos OGMs devem ser regulamentados como OGMs, e que deve ser aplicada a decisão do tribunal da UE de 2018. A decisão garante que todos os alimentos com genoma editado sejam cuidadosamente avaliados do ponto de vista da segurança alimentar, rastreáveis e rotulados. Sem essa regulamentação, significaria que os novos OGMs poderiam chegar às nossas mesas sem o nosso conhecimento.
Em meados de janeiro, o Slow Food e outras ONGs participaram de uma reunião com o mais alto funcionário encarregado da saúde e segurança alimentar, a Comissária Europeia da Saúde e Segurança dos Alimentos, Stella Kyriakides, para garantir que ela ouvisse um ponto de vista diferente do da indústria biotecnológica: os OGMs e os novos OGMs devem continuar sendo regulamentados para que produtores, consumidores, criadores e comerciantes possam ter a liberdade de escolher alimentos sem OGMs.
A seguir, os aspectos principais tratados pelo Slow Food:
- A Estratégia da UE “Farm to Fork” (do Prado ao Prato) inclui várias medidas para oferecer mais informações aos consumidores sobre seus alimentos, para que os cidadãos possam fazer escolhas informadas, contribuindo para a transição para sistemas alimentares mais sustentáveis. Isso inclui propostas para aprimorar a rotulagem sobre origem dos alimentos, um selo de bem-estar animal, etc. Em relação aos OGMs e à edição de genoma, a rotulagem também é fundamental: os consumidores só podem fazer escolhas conscientes se os alimentos com genoma editado forem rotulados de forma clara.
- Sabemos que os consumidores europeus (ainda) não querem OGMs em sua comida – uma pesquisa recente de 2020 realizada pelo BEUC, a organização europeia dos consumidores, mostra que quando se trata de comida, consumidores consideram “sustentável” um sinônimo de alimento que respeita o meio ambiente, sem OGMs ou agrotóxicos. A pesquisa também mostra que os cidadãos da UE querem alternativas de carne sem OGMs.
- Uma desregulamentação dos novos OGMs significaria que consumidores, comerciantes, produtores e criadores não poderiam escolher alimentos sem OGMs. Também afetaria a confiança dos consumidores em relação a rótulos como orgânico, DOP, IGP, que já não poderiam garantir não ter OGMs.
O Slow Food conduz suas atividades de defesa de várias formas: com parcerias com ONGs de diversos setores pressionando governos nacionais, trabalhando com comerciantes e reunindo-se com altos funcionários da UE para apresentar nossos argumentos.
A luta deve continuar! O Slow Food continuará defendendo alimentos e rações animais sem agrotóxicos e OGMs. O Slow Food defende, de forma resoluta, um futuro sem agrotóxicos e OGMs, uma perspectiva cujo cerne é o valor dos alimentos e a dignidade dos produtores.
Os Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) representam uma ameaça tanto para a sobrevivência da biodiversidade quanto para a soberania alimentar das comunidades rurais, levando-nos, cada vez mais, na direção de modelos agrícolas mais intensivos, com uma abordagem generalizada de monoculturas, em que as espécies muitas vezes não têm nenhuma ligação histórica, cultural ou gastronômica com o lugar e seus moradores. Além disso, os OGMs não oferecem benefícios ambientais, apesar das declarações de seus defensores. Ao contrário, os cultivos transgênicos empobrecem a biodiversidade de animais e plantas, selvagens e domésticas, contribuíram para um uso crescente de herbicidas na agricultura e a possibilidade de efeitos tóxicos ainda não foi descartada.
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