S.o.S Amazônia: o governo brasileiro entrega a floresta às mineradoras
01 Set 2017

O presidente Michel Temer extingue uma reserva natural, grande quanto a Dinamarca, para entregá-la às mineradoras.
O presidente do Brasil Michel Temer extinguiu a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), deixando nas mãos das mineradoras uma área protegida de 46.000 quilômetros quadrados de floresta situada entre os estados de Amapá e Pará.
Aparentemente essa região é rica em ouro e minerais preciosos e (como não concordar?) o governo precisa desses recursos para «atrair novos investimentos, gerar riqueza para o País, empregos e renda para a sociedade, no respeito da sustentabilidade do ambiente» conforme declara num comunicado, sem vergonha alguma, o Ministro das Minas e Energia. Gostaríamos de perguntar ao ministro o quê há de sustentável na pilhagem do último lençol de terra incontaminada que expõe a riscos, melhor dizendo, mata deliberadamente toda biodiversidade ali presente e subtrai os recursos necessários para a vida de todos, humanos, animais e plantas. Uma decisão que representa um furto para a humanidade inteira e um crime perante a flora e a fauna, não somente brasileira, mas mundial. Todos nós pagaremos as consequências pois certamente um desmatamento dessa magnitude não contribuíra a mitigar o aquecimento global.
Assim mesmo, podemos ficar tranquilos pois o governo esclareceu que nove áreas da reserva, inclusive aquelas nas quais vivem em equilíbrio perfeito e isolamento, as populações indígenas, «continuarão sendo protegidas». Como não!
«É a pior agressão à Amazônia ocorrida nos últimos 50 anos, nem a ditadura militar, nem a construção da rodovia Transamazônica conseguiram produzir uma devastação como esta» declarou Randolfe Rodrigues, senador da oposição. A atividade minerária na região levará a explosões demográficas, graves conflitos entre as populações indígenas, desmatamento, destruição de recursos hídricos, perda de biodiversidade e criação de conflitos territoriais. Precisamos dizer mais? Infelizmente, vem mais por aí.
«A América Latina, em vez de buscar outros caminhos de desenvolvimento está regredindo ao extrativismo de grande escala, como ocorria no período colonial, com profundas consequências também para as economias locais» escreve o ex-ministro do Meio ambiente colombiano, Manuel Rodríguez Becerra, no jornal La Stampa («Assim regredimos ao período colonial. O relançamento econômico ignora a Terra» de 25 de agosto de 2017).
O perigo é que, além das feridas produzidas pela mineração, irão se acrescentar, como é de se esperar, as feridas para a construção das vias de comunicação que atrairão milhares de «camponeses, lavradores sem terra, que iniciarão a subtrair grandes porções da selva para lavoura, madeira e plantio de subsistência. Depois dessa colonização chegarão também os empreendimentos de pecuaristas de grande porte, semelhantes àqueles que, no passado, introduziram a produção industrial de carne na Amazônia». Exatamente aquilo de que precisávamos.
Para que conste, acrescentamos que o governo garante que as mineradoras estarão autorizadas somente numa área equivalente a 30% da ex-reserva e que, nem é preciso dizer, as populações indígenas serão respeitadas e as atividades minerárias serão sustentáveis.
«São sempre os mesmos chavões abusados que se esvaziaram de qualquer significado», afirma Carlo Petrini entrevistado por Niccolò Zancan em La Stampa («O dano é irremediável, precisamos impedi-lo imediatamente» de 25 de agosto de 2017), o governo fala em desenvolvimento mas de «Que desenvolvimento estamos falando? O depauperamento dos territórios, da agricultura e da biodiversidade sempre constituem formas de destruição. Não de desenvolvimento. Não haverá bens comuns, centenas de milhares de pessoas não obterão nenhum benefício. A indústria de mineração irá destruir os territórios e criar novos escravos. Assim como ocorre na África com relação aos minérios necessários à produção de nossos celulares. Voltaremos ao tempo dos servos da gleba». Esse desastre anunciado porém, tange a todos nós: «Aquele imenso pulmão verde mantém o equilíbrio do planeta. Purifica o ar do planeta. Nós também nos beneficiamos com isso. Virá o dia em que teremos que prestar contas: como é possível continuar destruindo o meio ambiente? Precisamos pensar em termos globais».
Esperamos que a comunidade internacional se mobilize para deter esse desastre anunciado. Infelizmente, não se trata apenas de mais um lasso chavão jornalístico.
Segundo os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, entre agosto de 2015 e julho de 2016 foram desmatados cerca de 8000 quilômetros de floresta, cinco vezes a extensão de Londres. A taxa de desmatamento aumentou 29% em um ano: dados semelhantes àqueles de 2008.
As declarações internacionais chegaram a surtir algum efeito, e no dia 28 de agosto, Temer publicou um outro texto que revogou o decreto 9.142/2017, que extinguia a Renca. O próprio Palácio do Governo brasileiro entendeu que havia necessidade de se explicar. Ou seja, o novo texto revoga o decreto original, define como as atividades de mineração deverão ser realizadas pelas empresas, mas mantém e extinção da reserva. Segundo o governo, há a necessidade de se regularizar a atividade de mineração na área, uma vez que existem muitos garimpos ilegais. Porém, não menciona, em momento algum, as consequências negativas para as áreas protegidas do entorno.Mais uma vez o governo brasileiro ilegítimo demonstra sua autoridade, lançando decretos presidenciais que não passam pela aclamação popular. Fere direitos, ameaça futuros, desconsidera o ser humano e o ambiente que o cerca.O Brasil tem todas as oportunidades para mostrar ao mundo inteiro uma nova forma de desenvolvimento, considerando a riqueza de sua biodiversidade, tão característica da Amazônia. Porém, os dirigentes do país insistem em ignorar as potencialidades de se desenvolver uma agricultura calcada nos princípios agroecológicos, por exemplo, que poderia dar uma nova roupagem à região amazônica, desenvolvendo atividades condizentes com o ambiente. Mas, não. Degrada-se a floresta, extermina-se culturas locais, desconsidera-se todo e qualquer possibilidade de uma atividade alternativa. O que a Natureza tratou de cravar nas entranhas da terra, recobrindo-a com o rico e belo manto verde, agora sofrerá com a ambição daqueles que não pensam no futuro de jovens como eu, que já perderam totalmente a paciência com os homens de terno. A resposta virá.É necessário continuar a acompanhar o desenrolar desta que será uma longa novela, encampada pela Agência Nacional de Mineração, do próprio governo, que carregará consigo os interesses de parlamentares que detêm, por ora, o poder da caneta e do papel.
Carlos Demeterco, Facilitador Slow Food Brasil – região Norte
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