Orgulho de ser agricultor
17 Jun 2015
Orgulho de si é uma ideia forte, simples e corajosa. Às vezes, os ingredientes mais importantes não se encontram nas páginas de um cardápio: para descobri-los, é preciso observar os olhos e as mãos de quem combina sabores, num delicado equilíbrio entre tradição e frescor.
No vilarejo de Fishtë
São as mãos e os olhos de Altin e Anton Prenga, claros e sempre em movimento, que dão as boas-vindas a quem chega ao Mrizi i Zanave (“a sombra” ou “a sesta das fadas”), no vilarejo de Fishtë.
Poucas casas despontam na paisagem árida e fascinante do noroeste da Albânia, suspensa entre a tepidez prateada do mar Adriático e o perfil ameaçador e escuro dos Alpes albaneses.
Em poucos anos, pouco a pouco, Mrizi i Zanave – restaurante e convivium Slow Food – tornou-se um ponto de referência para quem, na Albânia, olha para o futuro sem negar os vínculos com uma tradição culinária e cultural muito profunda.
“É preciso contaminar ideias e sugestões, protegendo os produtos e os conhecimentos da nossa terra.” Com os dois irmãos Prenga, de volta depois de uma longa experiência de trabalho na Itália, e protagonistas do que foi definido como um verdadeiro renascimento dos restaurantes albaneses, atravessamos as videiras de kallment – antiga cepa local – que cercam o restaurante.
“A ideia fundamental está aqui, à nossa volta, até onde o olhar alcança. Tudo aquilo que levamos para a mesa, da água ao sorvete de romã silvestre, dos queijos à carne de cabrito e cordeiro, vem da nossa terra.”
Numa região caracterizada pela pobreza e emigração, a ideia e o trabalho de Altin e Anton criaram um sistema integrado, formado por dezenas de pequenos produtores, 25 funcionários, uma loja para os produtos locais, clientes que chegam não apenas de toda a Albânia, mas também do Kosovo e de Montenegro.
Tudo reunido por uma culinária capaz de ser nova e antiga ao mesmo tempo. E de devolver o orgulho e o sentimento de pertencer. “Também escrevi numa camiseta ‘krenar qe jam fshatar’, tenho orgulho de ser agricultor”, conta Altin, sorrindo. Uma frase quase revolucionária para a Albânia, onde a ligação com a terra hoje é motivo de indisfarçável vergonha. Um orgulho que é reanimado pela ideia de “servir, nas mesmas mesas, primeiros ministros e moradores locais”. “Pois promover o local”, sublinha Anton, “significa poder oferecer preços mais baixos. E a experiência da nossa cozinha deve ser acessível a todos”.
Até o coração de Tirana
Apostar no local, porém, não quer dizer bairrismo rígido. Por isso, os irmãos Prenga estão entre os primeiros apoiadores da Aliança dos cozinheiros do Slow Food, iniciativa que deve chegar em breve na Albânia, envolvendo xxxx cozinheiros, que se comprometem a utilizar os produtos das Fortalezas Slow Food e da Arca do Gosto em seus cardápios. Uma forma consciente de criar vínculos e contaminações entre local e global. Até mesmo à mesa.
Uma iniciativa que chega até o coração de Tirana. Entre os chefs envolvidos no projeto, Bledar Kola, jovem talento da nova culinária albanesa, estagiário do prestigiado restaurante Noma, de Copenhague, agora lançou-se numa nova aventura, no Bacchus, inaugurado há poucos meses no centro da capital albanesa. Mistura com sabedoria elementos tradicionais, como a massa folhada dos bureks, com saladas delicadas, mais próximas dos sabores ocidentais, e fala com admiração visível do trabalho dos irmãos Prenga.
“Aqui, na cidade, os desafios são muitos e diversos”, diz Bledar, ‘o rei da cozinha albanesa’, enquanto leva ao forno uma carne de cordeiro, acompanhada de uma musse à base de creme azedo, ovos e berinjela. “Acho que na nova realidade de Tirana, que se abre para o mundo, mesmo querendo permanecer ela mesma, a palavra-chave é “equilíbrio”: entre tradição e novidade, entre local e internacional, entre expectativas e capacidade de propor uma mudança.” Um equilíbrio sutil, nada óbvio, mas carregado de perspectivas e potencialidades, sobre o qual caminha o futuro da relação entre cozinha, identidade, transformação, riqueza cultural e sustentabilidade econômica. Inclusive na Albânia.
A Aliança Slow Food dos cozinheiros nasceu na Itália e difundiu-se internacionalmente. Hoje, entre Itália, Holanda, Marrocos e México, são 400 cozinheiros que, com seu trabalho, apoiam os pequenos produtores guardiães da biodiversidade.
O Slow Food e VIS Albânia (Volontariato Internazionale per lo Sviluppo) – em parceria com o Ministério de Agricultura, Desenolvimento Rural e Gestão das Águas da Albânia – têm o prazer de anunciar o lançamento da Aliança Slow Food dos Cozinheiros na Albânia, para o dia 19 de junho de 2015. A Aliança Slow Food dos Cozinheiros apoia os pequenos produtores, guardiães da biodiversidade alimentar no mundo inteiro. Os cozinheiros escolhem e utilizam em suas cozinhas, diariamente, os produtos das Fortalezas +, da Arca do Gosto e as hortaliças, as frutas, os queijos produzidos localmente. Atualmente, o projeto da Aliança está presente na Itália, Holanda, Marrocos e México. A Albânia conta com 22 produtos da Arca do Gosto , uma Fortaleza já iniciada (o Gliko de Permet), e uma Fortaleza em fase de implementação (o Mishavin, um queijo preparado pelos pastores transumantes do Kelemendi superior, nos Alpes Albaneses).
Francesco Martino
Foto: Ivo Danchev
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