Nada de OGM em nossos supermercados!

22 Fev 2021

Nada de OGM em nossos supermercados: eis as razões da campanha que o Slow Food, juntamente com muitas outras associações, está realizando no Reino Unido.

‘Imagine ter uma tesoura mágica que permite “melhorar” os alimentos naturais. Com esta tesoura você pode recortar todas as coisas desagradáveis e colar novas características mais interessantes: melhores colheitas, nutrientes superiores, e assim por diante. Teoricamente falando, essa tecnologia já está aqui: é a edição genética ou de genomas.[1]’ Aqui, nestas breves linhas, fornecemos uma descrição eficaz da nova fronteira da modificação genética.

Visto que a geração mais antiga de OGM fracassou substancialmente em produzir todos os benefícios prometidos, as lobbies ligadas aos interesses econômicos agroindustriais estão apostando fortemente nesta tecnologia, argumentando que se trata de uma “leve” manipulação genética  semelhante à seleção genética tradicionalmente realizada pelos agricultores ao longo dos séculos. Mas a edição genética (que a indústria gosta de chamar de “Novas Técnicas de Reprodução”) obtida através de técnicas de engenharia genética de “corte e costura” deve ser considerada e regulamentada, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça Europeu em 2018, da mesma forma que outros OGM, pois até hoje não há evidência de que estes novos OGM sejam isentos de riscos para a agricultura, o meio ambiente e a biodiversidade.

Nada de OGM

Preocupa que os novos OGM sejam apresentados como um caminho para a agricultura sustentável. Os novos (e antigos) OGM são totalmente incompatíveis com a agroecologia e a agro-biodiversidade. Tais produtos atentem às fortes solicitações daqueles agricultores que preferem continuar com a monocultura agrícola e se recusam a adotar técnicas que permitiram uma maior resiliência das terras e áreas rurais. Os OGM constituem o extremo de um sistema agrícola, econômico e político que está concentrando, cada vez mais, o poder nas mãos de poucos, não apenas beneficiando as corporações, mas também prejudicando as comunidades rurais e os consumidores, assim como o meio ambiente e a biodiversidade. As culturas obtidas através das novas técnicas MG devem continuar sendo reguladas como OGM (ou seja, avaliação e aprovação de segurança pré-comercialização, rastreabilidade e rotulagem que forneçam a consumidores e agricultores a liberdade de escolher, comprar e produzir alimentos livres de OGM.[2]

A tentativa de estabelecer a desregulamentação no Reino Unido

O cenário mais recente na tentativa de estabelecer a desregulamentação para novos e antigos OGM é atualmente o Reino Unido, onde, desde o dia 7 de janeiro, o governo lançou uma consulta pública online que durará até 17 de março de 2021, para que todos possam se pronunciar sobre o assunto. Conforme os resultados obtidos, o DEFRA (Departamento de Meio Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais do governo, responsável pela proteção ambiental, produção e normas alimentares, agricultura, pesca e comunidades rurais no Reino Unido) pode alterar a legislação para modificar a definição de um OGM tal como é entendido na Inglaterra. Atualmente o Reino Unido está vinculado à sólida legislação sobre cultivo e alimentos geneticamente modificados vigente na União Europeia.

Conforme o parecer do DEFRA os organismos produzidos através da edição genética ou de outras tecnologias genéticas não devem ser regulamentados como OGM se podem ser produzidos por métodos tradicionais de reprodução.

É notável como os governos e as lobbies das empresas agroindustriais persistem teimosamente em questionar a vontade popular, repetidamente comprovada, de excluir alimentos geneticamente modificados de suas mesas e campos. Recentemente, o Parlamento Europeu, por uma forte maioria e, pela 50ª vez, desde 2015, se opôs à importação de cinco novos OGM. Tendo saído da União Europeia, o Reino Unido tem a possibilidade de abrir uma consulta pública sobre as implicações que envolvem esta matéria.[3]

Nada de OGM

O DEFRA não considera como suficientes os resultados de uma pesquisa realizada pela Food Standards Scotland em 2020 indicando que 57% dos consumidores declaram que os alimentos geneticamente modificados, além do frango com alto teor de cloretos, constituem a preocupação principal; nem o resultado de outro estudo realizado pelo National Centre for Social Research em 2020, concentrado sobre questões relacionadas ao Brexit, indicando que 59% dos consumidores desejam manter a proibição de cultivos geneticamente modificados; nem os resultados de outra pesquisa conduzida pelo Economic and Social Research Council do Reino Unido em 2021, apontando que 64% dos participantes da enquete são contrários ao cultivo de alimentos geneticamente modificados. Apesar de não se concentrar especificamente nos OMG, uma recente Pesquisa não controlada realizada no Reino Unido  entre os eleitores indecisos denominados “Red Wall” (Muralha vermelha), a maioria dos quais havia votado para a saída da União Europeia, mostra que tais eleitores são fortemente contrários ao enfraquecimento das leis sobre alimentos, não obstante esse posicionamento possa ser visto como traição ao próprio voto favorável ao Brexit.

Quando o governo abriu a consulta pública, houve uma imediata mobilização da sociedade civil do Reino Unido. Os apoiadores afirmam que depois de mais de 20 anos de experiência com alimentos geneticamente modificados essa tecnologia fracassou na obtenção de maiores colheitas, na adaptação das sementes e das variedades às mudanças climáticas, na redução do uso de pesticidas e, como neste último caso, a situação, inclusive, piorou.

Nada de OGM em nossos supermercados: uma campanha dirigida aos supermercados

Slow Food do Reino Unido e Beyond GM tomaram a iniciativa de promover uma campanha visando os grandes supermercados, para que eles se posicionem contra os OMG – provando que, assim fazendo, podem responder à vontade da maioria dos próprios consumidores. Além disso, visto que os OGM não rotulados são ilegais na União Europeia, para os varejistas, a desregulamentação tornou-se uma verdadeira “dor de cabeça” pós-Brexit devido à dupla legislação para comerciantes da Irlanda do Norte. Além disso, seria extremamente complicado garantir que nenhum produto geneticamente editado, sem rótulo, chegue às prateleiras da União Europeia e esta, por sua vez, sofre pressões de muitas empresas pró-GM e legisladores para desregulamentar essas tecnologias[4].

Os líderes no âmbito dos alimentos, da agricultura, assim como os líderes religiosos, económicos, democráticos e académicos e o ativismo estudantil, escreveram aos supermercados[5] Britânicos pedindo-lhes que se recusassem ter entre os próprios estoques alimentos produzidos a partir de safras e animais geneticamente editados não regulamentados e não rotulados. Entre os 50 signatários dessa carta conjunta encontram-se a Soil Association (Associação em prol do solo), Landworkers’ Alliance (Aliança dos trabalhadores do campo), Students for Sustainability (Estudantes em prol da Sustentabilidade), Green Christian (Cristãos Ecologistas) e o Professor Emérito de Políticas da Alimentação da City University, Tim Lang, que representam uma ampla diversidade de interesses e de especificidades. Eles também representam as preocupações de milhões de apoiadores e membros em todo o Reino Unido.

Nada de OGM

Nesta altura, na passada terça-feira, o governo britânico, através do Ministro da Agricultura e Ambiente do Reino Unido, George Eustice, saiu do trabalho de madeira, dizendo à Reuters que “a edição de genes poderia desempenhar um papel fundamental no sector da beterraba sacarina do Reino Unido” e reiterando o seu apoio ao relaxamento dos regulamentos. Poder-se-ia dizer neste momento que “o rei está nu”, uma vez que uma consulta pública não é uma consulta pública quando já foi tomada uma decisão.

Os activistas continuam esta batalha, que parece ser uma luta desigual contra interesses gigantescos.

É por isso que Slow Food Internacional também apoia essa luta e pede a todos que façam ouvir a própria voz através das redes sociais, usando a hashtag #NotInMySupermarket.

Os supermercados britânicos têm boas razões para tomar uma posição, e esperemos que o afirmem alto e bom som!

Para mais informações
Pat Thomas, Director, Beyond GM
Email: [email protected]
Websites: https://beyond-gm.org and https://abiggerconversation.org
Shane Holland, Executive Chairman, Slow Food in the UK
Email: [email protected]
Website: https://slowfood.org.uk

 

[1] Johanna Blythman, The Herald

[2] https://www.slowfood.com/wp-content/uploads/2021/02/F2F_Bio_Strat_Report-1.pdf

[3] https://consult.defra.gov.uk/agri-food-chain-directorate/the-regulation-of-genetic-technologies/

[4] https://www.slowfood.com/how-is-slow-food-keeping-gmos-out-of-europe/

[5] https://www.slowfood.org.uk/ge/

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