A Política Agrícola Comum da UE: aspectos importantes que você precisa saber

25 Jun 2020

A Política Agrícola Comum (PAC) é uma das políticas mais antigas da UE. Depois de mais de dez anos de escassez de alimentos e fome, no Pós-Segunda Guerra Mundial, e,1962 foi introduzida a PAC, para aumentar a produção agrícola, garantir segurança alimentar, defender a qualidade de vida dos agricultores e estabilizar os mercados, mantendo preços acessíveis para os consumidores.

Hoje, a PAC representa quase 40% de todo o orçamento da UE. A cada sete anos, a PAC é renovada. A nova PAC será introduzida em 2021, e enfrenta novos desafios para cumprir com as metas de sustentabilidade, defesa da biodiversidade e meio ambiente.

A PAC desempenha um papel fundamental nos sistemas alimentares e agrícolas da Europa, e gostaríamos de explicar os aspectos mais importantes que todos os cidadãos europeus precisam conhecer.

  1. Por que a Europa precisa de uma Política Agrícola Comum, e como a PAC afeta as políticas nacionais?

A Política Agrícola Comum (PAC) foi criada em 1962 para garantir às pessoas alimentos a preços acessíveis, assegurando aos agricultores um nível de vida digno. Após a Segunda Guerra Mundial, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (hoje, União Europeia), que recém havia sido criada, tinha o objetivo de unir um continente fragmentado. A falta de alimentos era um dos primeiros desafios; a ação a nível europeu era necessária para que a Europa se tornasse autossuficiente em alimentos, e para garantir um abastecimento estável de alimentos e o livre fluxo de alimentos e produtos agrícolas dentro da Europa.

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Photo by Sam Carter on Unsplash

Atualmente, com 27 Estados-Membros, a União Europeia desempenha um papel importante, protegendo o setor agrícola da UE e regulando e assegurando estabilidade de renda, mercado e medidas de desenvolvimento rural. A política ajudou a reduzir a dependência da Europa das importações e aumentou o papel da UE nos mercados internacionais por meio de uma abordagem orientada para a exportação. Por outro lado, porém, levou a um à superprodução e ao excesso de alimentos e bebidas.

Hoje, a PAC representa cerca de 40% do orçamento da UE. Continua sendo a política mais integrada da UE, ou seja, a com mais decisões tomadas a nível da UE.

Cada Estado-Membro deve certificar que a PAC seja implementada a nível nacional. Isto implica a criação de estruturas e ferramentas para regular o acesso dos agricultores aos recursos, bem como para garantir que os beneficiários cumpram as regras. A próxima reforma da PAC será mais importante do que nunca para os Estados-Membros. A Comissão determinou os objetivos e as metas de base, mas cada país terá liberdade de adaptar a política ao contexto nacional. No entanto, a Comissão será responsável por assegurar que os Planos Estratégicos sejam suficientemente ambiciosos para alcançar os objetivos globais da UE.

  1. Como a PAC mudou ao longo dos anos?

Durante mais de 50 anos, a PAC foi reformada várias vezes, evoluindo e mudando significativamente. Desde os anos 90, as reformas da PAC passaram gradualmente do foco exclusivo na produção agrícola (pós-Segunda Guerra Mundial) para uma visão mais holística, com o objetivo de impulsionar o aumento da competitividade, um maior foco no desenvolvimento rural e na sustentabilidade.

Ao longo dos anos, a estrutura de financiamento da PAC mudou consideravelmente. Os subsídios à exportação e as medidas de apoio ao mercado diminuíram gradualmente. Os pagamentos diretos associados (pagamentos ligados à produção) foram praticamente eliminados e substituídos por pagamentos diretos dissociados (pagamentos ligados à superfície) ou foram associados a condições mais rígidas para receber os fundos que a UE precisava investir em seus territórios. Isso se tornou necessário não apenas para aumentar a produtividade, mas também para preservar o meio ambiente e melhorar as práticas agrícolas sustentáveis. Em 2013, a PAC começou a apoiar de forma mais consistente o desenvolvimento sustentável e a agricultura orgânica. Questões como bem-estar animal, sustentabilidade, desenvolvimento rural, agricultura orgânica, natureza e preservação da biodiversidade assumiram maior relevância, pois as consequências negativas da agricultura industrial orientada pela abordagem produtivista tornavam-se mais evidentes. No entanto, muito ainda precisa ser feito a esse respeito.

  1. A PAC apoia a agricultura sustentável?

De acordo com a Comissão Europeia, responsável pelo desenvolvimento da PAC, a PAC reúne “as dimensões social, econômica e ambiental rumo a um sistema agrícola sustentável na EU”. Existem várias medidas para incentivar a agricultura verde:

  • Condicionalidade (cross-compliance) – mecanismo que subordina os pagamentos únicos a uma série de critérios da UE em matéria de meio ambiente, saúde humana, vegetal e animal;
  • Pagamentos diretos verdes – ajuda aos agricultores que adotam ou mantêm práticas agrícolas que ajudam a cumprir as metas ambientais e climáticas;
  • Medidas de desenvolvimento rural que apoiam investimentos e atividades agrícolas que contribuem para a ação climática e a gestão sustentável dos recursos naturais.

Enquanto isso, o Tribunal de Contas Europeu, uma das sete instituições da UE, que cuida dos interesses dos contribuintes europeus, publicou um relatório em junho deste ano, afirmando que o contributo da PAC não travou o declínio da biodiversidade das terras agrícolas; ao contrário, contribuiu de várias formas a acelerar o declínio da biodiversidade das terras agrícolas. Além disso, em 2017, o Tribunal informou que o apoio ao rendimento (pagamentos diretos verdes) “não foi eficaz do ponto de vista ambiental”. De acordo com o relatório, devido às muitas isenções na política, dois terços dos agricultores qualificam-se para pagamentos verdes “sem estar sujeitos a obrigações ecológicas”.

A atual PAC está falhando em muitos de seus objetivos, especialmente no que diz respeito aos objetivos ambientais e de sustentabilidade. Em geral, a PAC não é uma campeã no apoio à agricultura sustentável, pois sua estrutura está ainda muito ligada a um sistema antigo, que recompensa os agricultores segundo a superfície (hectares) cultivada, ao invés de apoiar uma verdadeira transição para práticas ecológicas, oferecendo ajudas econômicas de acordo com o respeito das condições ambientais (condicionalidade).

  1. Quem se beneficia mais com a PAC?

A França é o país que mais se beneficia da PAC, seguem Alemanha e Espanha. De modo geral, os agricultores dos 15 Estados-Membros mais antigos da UE beneficiam muito mais da PAC do que os membros mais recentes, uma vez que seus agricultores recebem pagamentos maiores por hectare.

Falando em agronegócios, as fazendas industriais e os grandes proprietários de terras são os principais beneficiários da PAC. Estima-se que cerca de 80% das ajudas agrícolas vão para cerca de um quarto dos agricultores da UE – aqueles com as maiores explorações, criando graves desequilíbrios e favorecendo a agricultura industrializada e em larga escala. Apenas 2% do orçamento total vai para os jovens agricultores, sem apoiar adequadamente suas necessidades, como a educação em métodos agrícolas ecológicos, o apoio à criação de empresas ou o acesso à terra.

  1. Atualmente, uma nova reforma da PAC está em andamento. Como será melhorada a PAC? Quais são os principais pontos críticos?

Uma nova reforma da PAC, embora com a promessa de tomar novas medidas para “alcançar um sistema de agricultura verde e sustentável na UE”, foi muito criticada por ONGs e outras instituições da UE

O Tribunal de Contas Europeu, em seu relatório, afirmou que a Comissão “fica aquém das ambições da UE de um sistema mais verde e mais sólido baseado no desempenho”, afirmando que uma nova reforma carece de metas climáticas e ambientais claramente definidas e quantificadas.

Enquanto isso, cientistas europeus, em sua recente carta à Comissão Europeia, instaram a Comissão a melhorar drasticamente a fim de não danificar ainda mais o meio ambiente. Os cientistas afirmam que é precisamente a nova PAC que deve começar a procurar soluções para a crise ambiental. A transição ecológica da agricultura deve ser feita pela PAC, colocando imediatamente fim às ajudas baseadas no volume da produção e aos pagamentos diretos baseados unicamente na propriedade da terra.

As organizações da sociedade civil concordam que a atual reforma da PAC continua apoiando a agricultura intensiva, uma das causas principais da perda de biodiversidade e das mudanças climáticas. Um terço das emissões de gases de efeito estufa vem da produção agrícola industrial; e um relatório das Nações Unidas publicado recentemente, revela resultados alarmantes apontando para um declínio “sem precedentes e em aceleração” da biodiversidade global.

  1. Segundo o Slow Food, como pode a PAC ser melhorada

O Slow Food, junto com outras organizações da sociedade civil, criticou muito a nova reforma da PAC. O Slow Food foi ativo na campanha Good Food Good Farming, que pede aos decisores da UE que assegurem que a nova PAC responda aos desafios ecológicos, sociais e econômicos que enfrentamos.

Em carta aberta, o Slow Food e outras organizações europeias afirmaram que uma nova PAC deverá:

  1. acabar com a perda da agricultura comunitária de pequena escala oferecendo condições de trabalho decentes aos agricultores e trabalhadores rurais;
  2. acabar com os pagamentos por superfície de fazenda;
  3. combater a crise climática, restaurar a fertilidade do solo e a biodiversidade, proteger a água, reduzir a dependência energética e química e promover o bem-estar animal;
  4. priorizar a produção sazonal, local e justa.

Para a próxima reforma da PAC, o Slow Food pede:

  • O alinhamento e integração das metas das Estratégias “do Prado ao Prato” e “sobre a Biodiversidade” dentro da PAC
  • Que se combata a perda da agricultura comunitária de pequena escala oferecendo condições de trabalho decentes aos agricultores e trabalhadores rurais
  • O fim dos pagamentos cegos por hectare de fazenda, substituindo-os por financiamentos e ajudas direcionadas para promover uma transição para a agroecologia
  • Para enfrentar a crise climática, restaurar a fertilidade do solo e a biodiversidade, proteger a água, reduzir as dependências energéticas e químicas e promover o bem-estar animal através de financiamentos específicos.
  • Priorizar a produção sazonal, local e justa de frutas, vegetais, grãos, laticínios e carnes, garantindo o acesso a uma alimentação saudável, nutritiva e acessível para todos.

A revisão do Slow Food de uma nova proposta de PAC e pedidos específicos se encontram aqui.

  1. Que tipo de papel a Estratégia do Prado ao Prato e o Pacto Ecológico Europeu desempenham na PAC?

Com a recente introdução da nova política da Comissão, o Pacto Ecológico Europeu (Green Deal), e suas subpolíticas temáticas específicas, a Estratégia do Prado ao Prato e a Estratégia sobre a Biodiversidade, o Slow Food acredita que se tornou mais importante do que nunca alinhar a PAC com as novas ambições ambientais. É fundamental integrar os novos objetivos e metas estabelecidos em ambas as estratégias com a reforma da PAC em curso, que abrirá o caminho para o futuro da agricultura na Europa para os próximos sete anos.

As metas e objetivos das estratégias, que o Slow Food considera particularmente importantes para serem integrados na PAC são:

  • reduzir pela metade o uso de agrotóxicos;
  • reduzir o uso de fertilizantes químicos,
  • garantir que ¼ da agricultura seja orgânica;
  • melhorar os padrões de bem-estar animal,
  • aumentar a preservação da biodiversidade,
  • assegurar uma melhor informação aos consumidores;
  • oferecer acesso a alimentos saudáveis para todos.

Portanto, é fundamental que a nova PAC ofereça ferramentas e apoio para que essas metas se tornem realidade.

  1. Campanhas Slow Food para uma Política Alimentar Comum: se fosse introduzida, que tipo de papel a PAC desempenharia então?

O atual sistema alimentar não é sustentável e não está atendendo às necessidades dos cidadãos e do meio ambiente. O Slow Food acredita que uma Política Alimentar Comum poderia desencadear uma transição para a sustentabilidade de uma forma que as políticas agrícolas por si só não conseguem. A UE precisa de políticas que não olhem apenas para a agricultura, mas que considerem o sistema alimentar como um conjunto: todas as políticas afetando os sistemas alimentares, e todos os atores ao longo da cadeia alimentar, precisam trabalhar juntos pela transição para a sustentabilidade. Segundo o Slow Food, isso significa alinhar as políticas de agricultura, desenvolvimento rural, meio ambiente, comércio, saúde, segurança alimentar e desenvolvimento.

A nova Estratégia do Prado ao Prato é a primeira tentativa de criar uma política abrangente sobre alimentos. O Slow Food acredita que a Estratégia do Prado ao Prato represente a oportunidade de iniciar uma mudança necessária para construirmos sistemas alimentares sustentáveis e proteger o meio ambiente, os agricultores e a saúde.

No entanto, o Slow Food continua defendendo uma Política Alimentar Comum, desejando chegar a uma real integração das políticas. Atualmente, a Estratégia do Prado ao Prato é uma estratégia política. Tudo dependerá da sua implementação, e de como as diferentes políticas existentes irão integrar a Estratégia do Prado ao Prato na prática. Por enquanto, ainda temos uma Política Agrícola Comum.

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